29 de fev. de 2012

ESQUINAS

a esquina da rua de cima
larga
e só,
esquina grande
mas só

do outro lado
a esquina da rua de baixo
curta, breve

uma era em medida
tão grande
como tão pequena
era aquela esquina
de baixo

mas há uma curva
em cada uma
uma curva sem mesura

a de cima
continua lá
estática
grande

mas a curva de baixo
a pequena
a de baixo
grande se vê:

sabemos da verdade
que deixamos na curva
da esquina
de baixo

verdade visível
grande
palpável
feita da mesma espessura
que se conhece o outro

feita do mesmo arco
que se desenha a mão
na grandeza de tocar

17 de fev. de 2012

QUEM TEM NAS MÃOS UM POEMA


quem tem nas mãos um poema
não segura um deus, é certo!
mas quem o tem aos olhos
não deve vê-lo como assistir tv

não o leia como comer biscoitos
no passatempo vazio de esquecer,
nem como quem para fingir a dor
ingere remédio de efeito efêmero

um poema faz esquecer de vez
depois de o ler é para sempre.
não se volta, não distrai a hora
do tédio de pensar no dia seguinte

a marca que se lê não se perde
mas lembra no momento de hoje.
o prazer que pode ler um verso
vem de comer na verdade da fome



3 de fev. de 2012

PASSANDO PELA RUA


passam dois, quatro, seis olhos
me olham
como se quisessem descobrir
o que no instante reluz

provável que tenham no desejo
o que dos meus olhos escapa

(poderia pensar que me vigiam
ou me convocam.
no entanto, essas oscilações
não importam

poderiam me julgar que eu nos olhos
do meu sujeito exacerbado
vejo os olhos alheios
por dentro dos meus)

alguns podem não ter consciência
e sentem no olhar,
mas outros sabem
pelo imediato do olhar
o que seu também sabe sentir

é que os corpos acordam
ao encontro dos que passam,
por isso se dá passagem
à transpiração entre olhos:

na verdade, quem vejo
quem me vê
é o Amor de minutos atrás
no corpo ainda sinto
e aos olhos se revela
translucidamente