27 de fev. de 2009

Folha que me olha



Crivo
Nessa folha
Que me olha
Nessa hora noturna
Que eu olho
Para andar
Sobre a hora destas linhas

23 de fev. de 2009

No mar que nada tem a dizer - Rogel Samuel

O escritor Rogel Samuel fez o seguinte comentário
Jefferson Bessa escreveu um poema que diz:

Deixe-me no mar que nada tem a dizer
Deixe enrolar-me
nas ondas que florescem
Cá na beira onde meu corpo
se dobra

Por lá não posso estar
Mas aqui na ponta do mar
desponta o que bate em mim
Em mim que não sou,
Mas que sou com o mar o que brota
em cada baque
seu
neste litoral

Seu mar é seu próprio corpo, nomeado. Nomear é a presença! A impessoalidade é um fenômeno humanamente trágico, embora “normal”, visto no plano poético. Seu litoral é o limite de seu não-ser. Mas o impessoal, que se vê como mar, que tem a consciência de ser mar, ou que tem a sabedoria do vazio, é o poético. Esse vazio, ser mar, nada-ser ou não-ser-nada, quer ser algo: quer ser si mesmo, o resultado de seu esforço por ser-algo é o acontecimento de seu despontar "em mim que não sou".
O que o poema diz é: deixe-me ser como sou! deixe-me ser o que sou!
O nada, ao emancipar-se, ao passar a ser, esbarra na inutilidade de seus esforços do despontar aquilo que brota a cada instante em si, em cada onda.
Todo esforço, que parte de algo que tende a explicar-se, é ser mais, portanto na natureza do esforço mesmo de ser deixado em paz, a partir do nada, reside uma pretensão de emancipar-se, portanto de ficar em paz.
A realidade do poema: o sujeito é o objeto: deixe-me significar o que dei-me de mim a mim-mesmo o direito de ser.
O mar nada tem a esconder, a me dizer, pois sou eu-mesmo que me visto de oceano.

20 de fev. de 2009

No mar que nada tem a dizer - Jefferson Bessa


Deixe-me no mar que nada tem a dizer
Deixe enrolar-me
nas ondas que florescem
Cá na beira onde meu corpo
se dobra

Por lá não posso estar
Mas aqui na ponta do mar
desponta o que bate em mim
Em mim que não sou
Mas que sou com o mar o que brota
em cada baque
seu
neste litoral

14 de fev. de 2009

Na mesma prata reluzente


Quando se vê a lua escrita
Dela cintila plena
Aqui seu brilho ao céu.
Caindo aos olhos
Mantém-se erguida correta
Na mesma altura noturna
Dessa lua daqui.
Na mesma prata reluzente
Dessa lua daqui.
Mas é que a força da lua escrita
Respira a ancestralidade
Da lua que se faz lua.
Quando se vê a lua escrita
A sombra silenciosa
Dela flameja
Aqui sua vida ao céu.


(Jefferson Bessa)

7 de fev. de 2009

Às claras sombras da noite

A claridade da noite clareia. E os fulgores estrelares se movimentam quando clareamos da mesma forma esse brilho que, de um lado a outro, segue. É só olhar para o céu que se verá o passeio de infinitas cintilações. Longe de luzes citadinas e de homens que as escondem, a noite tem sua claridade. As sombrias luzes nunca surgirão assombrosas, pois elas não nos encobrem nada. Por outro lado, em sua insanidade, sob as suas escuridões, muitos homens se escondem – grande refúgio. É que sob essas sombras eles ficam sob as sombras de si mesmos. Essas inumeráveis camadas do sob em que vivem os homens! Aterram-se às noites, formando as suas trevas quando se escurecem da noite e de si mesmos.
A noite não oculta nada! Vejo as sombras noturnas – elas são as suas cores; a suavidade de suas luminosidades; os seus contrastes que são matizes de seus momentos; tornando-se aqui tão claras que aos olhos resplandece. O que se vê é a força flamejante do movimento circular, brilhante e pulsante que possui as estrelas. E todo esse momento se mostra por um movimento tão intenso e vivaz que a noite se torna exultante. Apraz-me retirar da noite as humanas-sombras para consentir as sombras noturnas. Se há poesia nesses instantes? Certamente. A poesia está menos em negar-se ao refúgio delas do que na coragem de ver as estrelas e a noite em superficialidade clara e fulgurante.
(Jefferson Bessa)

1 de fev. de 2009

Meus braços dormem

são meus braços?
quase não os sinto mais
constante dormência
...e dormem realmente!
realmente?
então, é real um braço, uma perna
uma face dormir!
dormem claramente.
são da matéria de uma casca dura
nada brota deles...e dormem
nem respiram, nem exalam
paralisados... e dormem.
jogo-os sob o choque
do sol, do fogo, do gelo
e meu movimento

não me movimenta mais
impermeável fico
perdeu-se a água, o ar
não escorrem, não lavam.
não respiro sensibilidade
dormindo num formigueiro
inteiro e interno que me move
sem me excitar nem hesitar.
passam os orvalhos e o sono e o infinito

e meus braços dormem!

(texto de Jefferson Bessa)