22 de fev. de 2010

ontem de um verso

retomar aquele verso no agora da manhã
mas ontem havia sol, hoje está nublado.
talvez não fosse ele pouquíssimo
como quando se afirma que um verso é
menos belo que um outro do poema.

fosse pouco, tivesse escrito ou ressurgido
o verso-ontem não relembraria o de agora.
era ele mais solar, de alta temperatura.
o de agora amanheceu nevoento, quente
sem chuva, um outro verso de momento.

talvez seja ele pouquíssimo
tão pouco quanto o pouco da lembrança deixada.
e me diz:
“retido no tráfego do corpo”
dizia outra coisa? ou era ele assim?
já é um outro.

ânimo do poema de agora só querer ouvir
com tímpanos doloridos o que fez do que não se fez,
este aqui é o ontem de um verso

16 de fev. de 2010

odor da carne



em você todo tremor
está no odor da carne
no suado paladar de beijo

não há nenhuma tontura
que se espalha das pernas
abertas às minhas mãos

não há mesmo nenhum deus
entre a mirra e a canela
da água eriçada das peles

eleva-se o toque crescente
sob o calor da noite, do dia
na firmeza do aroma forte

sinto o rosto hortelã de sexo
que adensa no ar, evapora
desaparece sem vertigem


*foto sem crédito encontrada na net

9 de fev. de 2010

largo de pele


em mim não se retém o medo
logo depois ando e sinto-o leve escoar.
não é a coragem que o faz ausente
e medo algum me desencoraja.
quantas vezes ameacei o medonho
e dava sobre ele marteladas de coragem.
quantas vezes busquei uma coragem
que acreditava estar no armário do medo.

mas o temor sinto e sozinho se esvai
sem os arredores da coragem admirada.
a bravura não corre pelos obstáculos
muito menos elimina o Mal
porque não se faz Bem, nem Força ou Morte.
se há alguma grandeza na coragem
digo do seu corpo grandioso e largo de pele
e por entre meus braços cresce ainda mais.

não enfrento o medo nem a coragem
nem o que escorrega do meio de seu peito
porque quando o poema se encoraja desliza
desce por mãos fortificadas, elevadas
do olhar dessas alturas de cair
sobre o rosto do beijo, da língua
dos dedos e cabelos
tudo assim erguido de corpo.

3 de fev. de 2010

ele me disse ao ouvido


para um amigo

depois de ouvir uma homenagem
em comemoração a um poeta
saíram os doutos homens da sala
julgavam da maior importância
celebrar a morte, a obra do bardo.
neles havia o prazer mórbido
da morte viva no tempo dos versos
em meio a datas e anos - feito missa.


depois de sair da sala caminhei
o trajeto se abriu em vil eternidade
e toda a idade da vida e do porvir
não existiu mais enquanto andava.
um verso ele me disse ao ouvido
li e em silêncio estávamos nós:
eu e o poeta sozinhos na rua
festejamos juntos naquela noite.


foto sem créditos