meus olhos acordaram feito dobradiças
abriram num canto de porta enguiçada.
estes olhos esquecidos de lançar óleo lubrificante
começaram a ver por ouvir ranger a abertura.
me tragam o lubrificante pois não há lágrima!
quem trará aos meus olhos o verniz de ver?
as retinas se soltaram - o pino das dobradiças!
que viço, que líquido, que água pode umedecer?
me tragam um alicate, acabem com o rangido
pois ainda se abrem arranhando, quase ruindo.
sinto meus olhos-porta, estão despencando
quem colocou a ferrugem impedindo de abrir?
espero que não me tragam lubrificante de cegar.
e se - como quem frita pela décima quinta vez -
me trouxerem óleo de cozinha reutilizado pela décima quinta vez?
meus olhos cegarão de vez, eles já estão ruindo.
então, me tragam sabão para esfregar
e inserir nas entranhas dos olhos. Vão arder de limpar!
às vezes tenho surtos de vida sanitária!
no entanto, não, aqui não se pede sanidade.
e se me trouxerem uma água para além d'água!?
mas a minha vizinha sã me trouxe água sanitária.
os olhos ficarão piores do que acordaram
o barulho ficará ainda mais cego e insuportável
não me tragam mais nada, me deixem emperrado
nas dobradiças dos olhos que me trouxeram.
não deveria ter pedido, tenho a mania de pedir.
triste pedir, pois alimenta o ranger das dobradiças
não me tragam nada, pois já me trouxeram
o enguiço dos meus olhos antes de acordar.
eu, rangendo, me perdi ao pedir - vejam só -
aquilo que me trouxeram bem antes e longe
Do e-livro Água Fria (2017)
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